segunda-feira, 30 de março de 2009

O maranhense Zeca Baleiro solta o verbo

Maranhão, engenhosa mentira
Não me espantará que num futuro próximo o Maranhão venha a ser chamado de "Uganda brasileira"

Zeca Baleiro
Última palavra (IstoÉ, nº 2035, 1ºabr/2009)

O Maranhão é um Estado do Meio Norte brasileiro, um preciosismo para nomear a região geograficamente multifacetada que é ponto de interseção entre o Nordeste e a Amazônia. Com área de 330 mil km2, pleno de riquezas naturais, tem fartas agricultura e pecuária, uma culinária rica e diversa e uma cultura popular exuberante. Não obstante tudo isso, pesquisa recente coloca o Estado como o segundo pior IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) do País, atrás apenas de Alagoas.

Sou maranhense. Nasci em São Luís, capital do Estado, no ano de 1966, mesmo ano em que o emergente político José Sarney assumiu o governo estadual, sucedendo o reinado soberano do senador Vitorino Freire, tenente pernambucano que se tornou cacique político do Maranhão, a dominar a cena estadual por quase 40 anos. De 1966 até os dias de hoje, são outros 40 anos de domínio político no feudo do Maranhão, este urdido pelo senador eleito pelo Amapá José Sarney e seus correligionários, sucedâneos e súditos, que gerou um império cujo sólido (e sórdido) alicerce é o clientelismo político, sustentado pela cultura de funcionalismo público e currais eleitorais do interior, onde o analfabetismo é alarmante.
O senador José Sarney, recém-empossado presidente do Senado em um jogo de caras barganhas políticas, parecia ter saído da cena política regional para dar lugar a ares mais democráticos, depois de amargar a derrota da filha Roseana na última eleição ao governo do Estado para o pedetista Jackson Lago. Mas eis que volta, por meio de manobras politicamente engenhosas e juridicamente questionáveis, para não dizer suspeitas, orquestrando a cassação do governador eleito, sob a acusação de crime eleitoral, conduzindo a filha outra vez ao trono de seu império. Suprema ironia, uma vez que paira sobre seus triunfos políticos a eterna desconfiança de manipulações eleitoreiras (a propósito, entre os muitos significados da palavra maranhão no dicionário há este: "mentira engenhosa").
Em recente entrevista, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso disparou frase cruel: "Não vamos transformar o Brasil num grande Maranhão." A frase, de efeito, aludia a uma provável política de troca de favores praticada pelo Planalto atualmente - segundo acusação do ex-presidente -, baseada em jogo de interesses regionais tacanhos e tráfico de influências. Como alguém nascido no Maranhão, e que torce para que o Estado alcance um lugar digno na história do País (potencial para isso não lhe falta, afinal!), lamento o comentário de FHC, mas entendo a sua ironia, pois o Maranhão tornou-se, infelizmente, ao longo dos tempos, um emblema do que de pior existe na política brasileira. Não é de admirar que divida o ranking dos "piores" com Alagoas, outro Estado dominado por conhecidas dinastias familiares.
Em seus tempos de apogeu literário, São Luís, a capital do Maranhão, tornou-se conhecida como a "Atenas brasileira". Mais recentemente, pela reputação de cidade amante do reggae, ganhou a alcunha de "Jamaica brasileira". Não me espantará que num futuro próximo o Maranhão venha a ser chamado de "Uganda brasileira" ou "Haiti brasileiro". A semelhança com o quadro de absoluta miséria social a que dois célebres ditadores levaram estes países - além do apaixonado apego ao poder, claro - talvez justificasse os epítetos.

Zeca Baleiro é cantor é compositor

Um comentário:

  1. É revoltante a condição de subjugação a que o Estado do Maranhão foi levado ao longo da história. Como pode um povo ser tão desprezado e conduzido a índices tão degradantes da condição humana??? Como pessoas tão inteligentes, nascidas em nosso Estado e que dizem amá-lo não conseguem desarticular essa máfia que destrói em miséria um ambiente tão rico socioambiental e culturalmente falando???? Os mecanismos de defesa são camuflados pela cortina de ignorância a que os cidadãos maranhenses foram e continuam sendo historicamente submetidos.
    A manipulação das camadas sociais é mais facilmente impetrada e engendrada quando as políticas públicas, principalmente as voltadas a educação, são relegadas a planos inferiores numa escala de prioridades....e tudo é mostrado como algo em pleno desenvolvimento por uma mídia produzida pelos "coronéis" do poder.
    É necessário que os gestores públicos que ainda acreditam no respeito ao próximo e que detém autonomia para tomar decisões façam algo que contribua efetivamente para mudanças radicais e positivas em relação ao declínio a que está fadada a maranhensidade presa no poder que insiste em se perpetuar.
    A educação envolta em valores éticos e espírito crítico deve ser executada desde a base do conhecimento humano e tratada como prioridade, só assim será construído algo sólido para a configuração dum Estado forte, em que sua gente é verdadeiramente valorizada, em que o ambiente é protegido e utilizado de forma sustentável.
    Não à politicagem!!! Assim o MA crescerá!!!

    Protejagaia.

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